Quando eu era menina, sempre que  falava uma palavra negativa, minha avó materna  me aconselhava, dizendo que as palavras tinham peso. Lembro que as palavras ” desgraça e desgraçada” encabeçavam a lista negra dela. Ela sempre me dizia que  palavras pesadas, como essas, se materializavam, gerando atraso de vida e que se eu as pronunciasse sempre , um dia  poderia surgir na minha frente  um espírito em forma  de  mulher vestida em trapos, sombria e com uma expressão assustadora, porque a “desgraça”  tem essa forma.  Passei a imaginar essa mulher terrível e nunca mais  pronunciei  essas palavras nem outras igualmente ruins, por medo de me deparar com elas personificadas. Depois de adulta, sempre preferi mais um palavrão para desabafar a usar essas palavras.

Minha avó era uma mulher inteligente, sábia, corajosa e de personalidade forte. Só sabia ler letras impressas, não sabia escrever e só aprendeu a assinar o nome. Era  alegre,  adorava ver novela na tv e  sacudia a cabeça diante das cenas como se estivesse concordando com  a história.  Gostava de uma boa conversa e não se chocava com  piadas picantes.  Adorava guardar  dinheiro no soutian, enroladinho num lenço; sempre havia alguem da família a lhe pedir emprestado, mas aguardava o dia combinado para ter a grana de volta. E como raramente pagavam em dia, ela reclamava comigo, adolescente, me dizendo que as pessoas deviam ter palavras e cumprir seus compromissos,  para que tivessem uma segunda chance quando precisassem de novo.

Pessoas  especiais  acrescentam e marcam nossas vidas para sempre. Minha avó querida tinha saúde frágil, mas ao mesmo tempo era absurdamente forte, determinada e rápida nas decisões. Guardo lembranças maravilhosas  daquele convívio especial. E por eu ser  a primeira neta, fazia minhas vontades na medida do possível. Era um pouco minha mãe também, pois passava muito tempo com ela enquanto minha mãe trabalhava duro em dois turnos. E  eu, ainda menina, cuidava  também dela e fazia tudo para agradá-la e ajudá-la  nas tarefas da casa, pois a amava muito,  assim  como amei minha querida mãe, outra  maravilhosa guerreira, que também me deu tantos exemplos de força e amor e marcou minha vida para sempre. Não convivi com meu pai, mas tive uma avó e uma mãe preciosas, que me ensinaram e me protegeram enquanto eu procurava meus caminhos. Aprendi que sonhar é fundamental, mas é a realidade do trabalho e a determinação que transformam os sonhos em realidade, já que nada cai do céu. Elas investiram nos meus sonhos, me mostrando também a realidade.

Ainda hoje me valho desses ensinamentos  e a cada dia  me venço, além dos meus desafios. O maior desafio é viver sem elas, que se foram  há muito tempo. Sempre sentirei  falta da presença  dessas  guerreiras e suas vozes estão vivas na minha memória.  Por isso, estão presentes em mim,  nos meus sonhos, nos meus melhores pensamentos.  E a cada conquista ou necessidade, sinto que estão por perto para me abençoar.

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Ceiça Monteiro

Ceiça Monteiro - Acredito na força do pensamento e no poder das palavras, que precisam ser positivas para que nos tornemos mais iluminados.

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